Valdevino José da Costa nasceu em Carangola, Minas Gerais, em 25 de agosto de 1917. Filho de pai português e mãe brasileira, desde muito cedo aprendeu a se virar sozinho.
Não teve uma infância fácil.
Foi separado da família ainda muito jovem.
Viu um de seus irmãos ser puxado para dentro do rio por um jacaré. Quase morreu afogado. Viu seu pai ser preso porque queria a guarda dos filhos. Cuidou de seus irmãos, cuidou de seus filhos, cuidou de seus sogros, cuidou de seus amigos...
Ficou 55 anos sem ver uma de suas irmãs. Lembro-me muito bem quando meu irmão mais velho, Silas, aproveitando um antigo programa radiofônico, denominado "Onde Anda Minha Gente", saiu a procura da Tia Sebastiana.
Tinha 12 anos quando num belo dia, eles chegaram. Foi uma festa, foi emocionante. O reencontro de meu pai e minha tia ficou gravado em minha memória como se fosse ontem. Lembro até da roupa que eu vestia.
Meu pai não gostava muito de falar de suas histórias, de seu passado.
Sempre se emocionava e sua voz terminava embargada. Mas nós gostávamos de ouvir.
Não perdíamos a chance de insistir para que contasse.
Falava muito do seu querido Rio Doce e da última vez que viu seu pai.
Era um homem belo, de caráter incomum.
Quando nasci meu pai tinha 50 anos e um abismo temporal nos separava. Mas, isso não impediu que o amasse, que o venerasse.
Meu pai jamais desistia de seus objetivos.
Acho que ele andou de bicicleta desde que nasceu, pois uma das imagens mais nítidas da minha infância era a de meu pai e sua bicicleta. Tinha uma caixa de madeira no porta-embrulhos da bicicleta e ali ele me carregava para todos os lados. Uma vez comprou uma daquelas cadeirinhas que ficam presas no guidão e ali eu fui confortavelmente instalada.
Era festivo e alegre.
Nós o adorávamos.
Incansável, não media esforços para ajudar alguém, ainda que isso o prejudicasse.
Meu pai passou quase toda a sua vida como lavrador e conseguiu criar dez filhos com seu pequeno salário.
Sua força motriz vinha de Deus.
Aos seis anos, mais ou menos, tivemos que nos mudar de Piranema, onde residíamos, para Senador Camará, bairro da Cidade do Rio de Janeiro.
Minha mãe não suportou a morte de minha irmã, Cenyr, de 16 anos. Mas essa é outra história de nossas vidas.
Nos mudamos. Meu pai nos visitava todo o final de semana. Ele chegava sempre com o bolso cheio de balas e bananadas.
Todas as segunda-feiras, quando acordava para se aprontar, mais ou menos às quatro da manhã, eu acordava junto e ele não saia sem jogar uma partida de dominó comigo.
Lembro de andar enganchada nos seus ombros a caminho da igreja, no Taquaral.
Mas a separação não durou muito. Voltamos para Piranema.
Meu pai foi exemplo em todos os seus negócios, em todos os atos.
Adorava a vida rural.
Ficou casado com minha mãe por 61 anos.
No final de semana anterior a suas morte, sonhei que alguém me ligava e avisava que meu pai havia morrido. Fiquei incomodada. Fui até sua casa e passei com ele um sábado inteiro.
Tomei do seu café delicioso. Sempre que me via chegar ia ao meu encontro no portão e me abraçava. Dizia: "minha filha, que saudade"!
No dia 1º de julho de 2004, alguém me ligou e disse que meu pai havia morrido.
Não podia ter nascido em data diferente. Dia do Soldado. Era um deles, guerreiro.
Meu pai, minha bússola.
Segundo Beecher, quando um homem bom desaparece, o céu desse mundo ainda continua iluminado por muito tempo depois de sua partida. A figura de um homem assim não se apaga deste mundo. Quando vai, deixa na terra muito de si.
Pai, mesmo estando morto, ainda vive em meu coração, ainda me guia pelas estradas da vida. Suas palavras e ensinamentos ecoam em meus ouvidos.
"Velho, o tempo está aqui...
Na filha que é teu renovo, de novo a vida se fez..."
Feliz Aniversário!
8 comentários:
Raquel, que lindo tudo o q vc escreveu... Isso é um dom seu, nunca pare!! Eu fiquei realmente emocionada... Amanhã será um dia saudoso pra vc, pois, como pude ler aqui, seu pai faria anos...Mas como dizem, quem disse que para estar junto precisa estar ao lado? Basta estar do lado de dentro, ñ é mesmo?
Parabéns pelo blog!
Beijinhos da sua aluna
Bianca Vieira(MG).
Obrigada Bia. Sim, amanhã será um dia saudoso. Meu pai era e é alguém muito especial na minha vida. Mas sei que ele está bem e sua imagem é aterna em mim, enquanto eu viver. obrigada. Beijos
Imagino que vc ao ler o que eu vou escrever vai abrir um sorriso e dar aquela sua gargalhada contida, mas gostosa...
bom o que eu digo é que vc é uma contadora de histórias nata...vc nunca pensou em escrever de fato??? sei que vc se realiza numa sala de aula, mas sempre acreditei que temos várias aptidões e que nada nos impede de vivê-las ao mesmo tempo. Pensa nisso... vc deveria escrever...vc escreve com alma, com vida é por isso que vc emociona quem lê suas palavras.
Que coleção de histórias bonitas vc tem...
beijo de quem te admira muito!
Carla
Já pensei nisso. Meu primeiro livro seria justamente sobre o meu pai. Mas vou pensar com mais carinho. Beijos
Não tenho palavras pra tal história...Só Deus sabe o quanto eu o amava e continuo amando...ainda guardo com muito carinho a minha primeira bíblia, foi ele quem me deu!!!!
Eliane Costa
Oi Eliane. Que bom me visitar!!! Sim, seu avô é aquele marco nas nossas vidas. Aquele que, quando surgem as tempestades, faz-se farol e ilumina nosso caminho.
Olá professora!! Fiz dúzias de módulos de direito eleitoral com você . Super bacana seu blog e linda a homenagem ao seu pai. Hoje estou no Tre-RJ e com grande ajuda sua!! Beijos,
Lucia
Oi Gabriel. Que bom!! As dúzias de módulos o ajudaram. Deus o abençoe nessa nova etapa. Obrigada. Bjs
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